domingo, 27 de maio de 2012

O SENHOR DAS ÁGUAS - UNIDADE X - CAPÍTULO 2


Nenhuma novidade no horizonte selvático...

Estamos com as mãos manietadas, esperando...

O que dói é esta passividade autoritária...

Que nos impõe paciência quando o mundo pode desabar...

Ou o caldeirão entornar, como é mais adequado à metáfora do momento...

O laptop...

Atenção, Celso!

Mensagem cifrada!...

Ele acordou da pasmaceira tropical e se mexeu...

Finalmente!

A mensagem foi decifrada em questão de milissegundos...

 A2 REPORT. A6 ELIMINATED. POSSIBLES OBSTACLES HAVEN’T BEEN REMOVED. PAY ATTENTION ON IT. “PAIS DAS AGUAS” OPERATION ON THE ROAD*.

– O que, exatamente, aconteceu? – perguntou Celso ainda sob tensão.

– Não sei – respondeu uma Wirna meio assustada. – Mas a mensagem está clara...

– Será que o Sérgio Tavares sabe de alguma coisa?

– Não sei... Liga pra ele...

Celso pega no celular e liga.

– Não, não – Wirna tenta deter o processo. – Não liga não...

– Fora de área – diz Celso impassível.

– Laptops em ação... Vamos contatar nossos canais naquela região imediatamente...

– Cuidado, Wirninha...

– Porquê?

– Pode ser que o próprio A1 tenha assumido a direção dos negócios...

– Mas que estupidez é esta que você está dizendo, Celso! É claro que o A1 está agindo por baixo dos panos, senão não seria o número um!

– Vamos nos movimentar então, Wirna. Vamos mostrar serviço...

– O que você quer fazer?

– Saber o que aconteceu na Raposa Serra do Sol, ué! Não foi você mesma quem falou?...



* RELATÓRIO DE A2. A6 ELIMINADO. POSSÍVEIS OBSTÁCULOS NÃO FORAM REMOVIDOS. PRESTEM ATENÇÃO NISTO. OPERAÇÃO “PAÍS DAS ÁGUAS” PROSSEGUE. TRADUÇÃO DO AUTOR.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

O SENHOR DAS ÁGUAS - TERCEIRA PARTE: A HIERARQUIA. UNIDADE X - CAPÍTULO 1


Eu já não sabia mais o que fazer para afastar o tédio que tomava conta de todos nós há mais de duas semanas.

As notícias eram as mesmas, todo santo dia...

“A reserva Raposa Serra do Sol parece mergulhada num mar de tranqüilidade depois dos dias conturbados das últimas semanas, quando ocorreram os conflitos de terra que ocasionaram dezenas de mortes no nordeste de Roraima”...

Esta foi a última notícia que eu lera num jornal daqui mesmo do Rio; depois tudo não passou de uma repetição incessante da mesmice, alterando-se apenas umas palavras em substituição a outras, porém com o mesmo conteúdo mecânico que os jornais sabem fazer melhor que ninguém...

Putz!

Que saco!

Não agüento mais olhar pra cara da Wirna e contemplar aquele rostinho...

De uma textura germânica insolar...

Linhas duras sempiternas que me lembram do famoso e arqueológico Muro de Berlim...

Ela nem perde o tempo dela comigo...

Está sempre ocupada, gerindo a Sweetwaters, que o faz, aliás, com muita competência...

Competência demais, eu acho...

Essa é a diferença entre os europeus e nós, por exemplo...

Tudo o que eles fazem, chegam quase à perfeição. Até os riscos são calculados...

Mas nós temos uma coisa que pra eles é um artigo de luxo...

A Criatividade exacerbada.

Claro, sem generalizar, porque o ser humano é ser humano em qualquer parte do mundo, e, em se tratando do poder criativo, inerente ao ente humano, um nigeriano tem as mesmas perspectivas que um esquimó.

Entretanto, com todo o planejamento supereficiente dos europeus, eles não conseguem desenvolver aquilo que em nosso povo abunda...

Eu acabo tendendo a admitir que isto seja uma compensação divina. A um povo tão sofrido e oprimido como é o brasileiro, Deus deu o dom da Criatividade, para contrastar com a mecanização européia, que gera dividendos, mas não beleza.

Não sei se isso pode ser colocado desta forma...

Eu fico olhando a tela deste laptop aqui...

domingo, 20 de maio de 2012

O SENHOR DAS ÁGUAS - UNIDADE IX - CAPÍTULO 4


Celha Regina não estava preparada para revelações desta magnitude...

Com a cabeça pesada, como que embriagada, trôpega, ela voltou ao seu alojamento...

Deitou-se na sua cama reles e tentou digerir todo aquele vendaval que lhe perpassava a mente, mas acabou dormindo...

O 7º PEF estava de prontidão...

Há muito tempo que seus integrantes não sabiam o significado da palavra relaxamento...

Sempre alertas...

No entanto, eles não puderam reagir ao ataque traiçoeiro que veio a seguir...

O A1, A2, ou as pessoas que se escondiam por trás da dita operação, como que percebendo que Paglia não fosse mais confiável, resolveram agir...

Um helicóptero sem identificação invadiu a área militar sob vigilância total de Uiramutã...

Estava armado até os dentes...

Armando Paglia não fez nada porque conhecia a origem deste aparelho, só não imaginava que ele mesmo fosse um dos alvos pretendidos...

Mas seus subordinados, no entanto, já haviam detectado o tal helicóptero não identificado, exceto Celha Regina...

Que dormia...

O helicóptero atacou como um relâmpago, golpeando sem perdão as instalações limitadas do 7º PEF...

Não sobrou muita coisa para contar a história...

terça-feira, 15 de maio de 2012

O SENHOR DAS ÁGUAS - UNIDADE IX - CAPÍTULO 4


Paglia estava justamente falando ao telefone comum depois que Felipe já deixara o quartel do 7º PEF.

Falava descontraidamente, embora se percebesse logo de cara que seu tom de voz obedecia a uma hierarquia muito superior a sua, que não exatamente a militar, conforme Celha Regina percebeu assim que passou por sua sala entreaberta naquela hora inoportuna.

Quer dizer, inoportuna para Paglia...

– Pode deixar, A2. Nada do que houve naquele acampamento clandestino dos traficantes pode atrapalhar os nossos planos... Eu estou enviando o tenente Corrientes pra Boa Vista... Eu sei que ele é perigoso, mas se for devidamente anulado, também não poderá nos atrapalhar... O General Barreiros vai dar uma dura nele... O delegado da polícia federal de São Paulo, sim, é muito mais perigoso do que ele. Eu sei disso. E o Amarilla?... Porque não podemos apagá-lo?... Ele tem as costas quentes? Quem é o chefe dele?... Você também não sabe? Deve ser o A1 o padrinho dele... Tá bom, eu deixo ele pra lá... Tá bom, A2! Não vou ficar falando à toa. Pode ficar tranqüilo! Não há ninguém aqui que possa decifrar isso... A operação será mantida. Positivo... Tá bom. Deixa comigo, A2...

Paglia desligou o telefone.

Celha Regina saiu na ponta dos pés daquele local conspurcado. Ela tremia pelo corpo todo...

Mas, na realidade, o que ela ouvira?

Embora houvesse muitas expressões em código, muita coisa não fazia sentido, porquanto ela não tivesse o livro dos segredos à mão. Mas uma coisa era certíssima! Aqueles fragmentos não deixavam dúvida; não precisava ser o Sherlock Holmes para compreender que tudo aquilo que ocupava o delegado da polícia federal, o tal Mouzon, o amigo de Felipe, estava ligado ao que vinha acontecendo na Raposa Serra do Sol. Talvez, a tal organização tivesse até um plano para eliminá-lo...

Uma pessoa deste grupo, porém, já estava identificada...

O Comandante Paglia.  

Como ela devia proceder daqui em diante?...

sexta-feira, 11 de maio de 2012

O SENHOR DAS ÁGUAS - UNIDADE IX - CAPÍTULO 3


       O que acontece quando todos os seus sentimentos se misturam de tal maneira que se parece com um mingau onde você não consegue mais identificar seus ingredientes básicos...

       Assim a cabeça de Felipe...

       Uma massa desnutritiva escura, esquecida na geladeira, sem função alimentar, mas que ocupa espaço, e fede.

       Felipe pegou sua única mala com o braço bom, o direito, suspirando de desgosto...

       Estava pesada como sua consciência...

       Mas não por culpa de alguma ação irrealizada, e sim devido às coisas mal resolvidas de sua vida...

       Tudo se juntava numa encruzilhada definitiva...

       Daqui em diante, Felipe sabia disso muito bem, não poderia continuar sem respostas, e não se tratava apenas dos mistérios que pairavam a sua volta, mas algo que calava bem fundo no seu coração...

       Não queria continuar com nada daquilo...

       A mentira, onde ela houvesse, queria se livrar dela como de uma doença perigosa, contagiosa, letal...

       Tudo o que cheirasse a esta civilização equivocada deixava-o possesso, profundamente deprimido, desesperançado...

Entretanto, como se livrar de um mal congênito?

Só havia uma saída...

Evitar que ele nascesse.

Só que agora era tarde...

O rebento desta loucura já estava bem grandinho...

Teria de ser suprimido...

Mas Felipe não se julgava o homem certo para proceder a esta operação...

Nem com uma injeção de Espírito Santo...

Ser gauche na vida também não adiantava...

E Felipe não era poeta; não possuía rimas, tampouco soluções.

Felipe pegou sua mala pesada e saiu.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

O SENHOR DAS ÁGUAS - UNIDADE IX - CAPÍTULO 3


       O braço ainda doía um pouco...

       Mas ele não ligava a mínima para isso...

       Tentava deglutir os últimos acontecimentos como coisas corriqueiras na vida de um militar profissional profundamente engajado no seu trabalho.

       O que não admitia, em hipótese alguma, era o tanto de mistério em relação às coisas que ele não conseguia explicação alguma...

       O que o deixava louco da vida, além do fato de Celha Regina ter adivinhado os próximos passos do Paglia, enviando-o a Boa Vista para fazer o relatório da missão diretamente ao General Barreiros e o Tenente-Coronel Ceddric, era que Celha não quis mais vê-lo depois do retorno daquela missão fatídica.

       Algo em seu íntimo lhe dizia que aquele acontecimento seria o divisor de águas que há tanto tempo ele previra.

       Suas malas estavam prontas...

       Mais uma vez.

       Logo após passar por Boa Vista, Felipe ganharia uma licença...

       “Para se recuperar das agruras da vida perigosa que levava”, disse Paglia com uma ironia lúdica tacanha.

       E Felipe ainda não tinha certeza se seria punido pelos superiores por descumprir ordens expressas.

       Ele tentou falar com Celha mais uma vez, mas o dormitório onde ela dormia estava trancado, apesar de saber que ela não fora dispensada...

       Tudo aquilo lhe parecia suspeito...

       Além de sua imaginação...

quinta-feira, 3 de maio de 2012

O SENHOR DAS ÁGUAS - UNIDADE IX - CAPÍTULO 2 (CONTINUAÇÃO)


– Disso ninguém sabe, delegado... O senhor está me superestimando...

– Não estamos fazendo nenhum progresso, seu cachorro desgraçado...

– Esqueça delegado. Porque o senhor não resolve fazer como seus outros colegas de profissão?... Vai passear de vez em quando no Caribe... O senhor gosta de mergulhar, delegado? Lá é o lugar ideal!... Como eu disse, o seu cacife é muito pequeno pra chegar perto da mierda toda...

– Mas você pode me ajudar, não pode? Pra livrar a sua cara imunda?

– A minha prisão, delegado, não vai lhe esclarecer nada. Acredite em mim. Eu não valho nada dentro da hierarquia...

– Que hierarquia, Castro? Perdão, Amarilla?

– Eu vou lhe contar uma coisa que vai lhe deixar estarrecido, delegado, mas adianto logo que isso não vai ajudar neste caso da reserva Zorra Sierra del Sol... E também porque sei que o senhor não representa ningúm peligro para estos grandones que buscas encarcerar...

– Sou todo ouvidos, Amarilla.

– O maior de todos os agentes duplos acá, em Sudamérica, chama-se...

– Fale, seu babaca! Não há escutas por aqui! Você não acredita que não podemos te prender? Então qual o problema?

– Hugo Chavez... Ele é o maioral na América Latina... Sua missão junto à CIA é botar fuego nas Américas, pra facilitar o terreno para uma invasão militar dos Estados Unidos... E o Brasil está na rota, porque tem a Amazônia e suas riquezas...

Mouzon começou a rir.

– Yo dice que o señor no tenía status pra comprender esta situación geopolítica...

– Eu sei o que o senhor quer... Quer atrapalhar minha investigação de qualquer jeito, só que eu vou estragar seu plano, Amarilla. Aproveite bem sua estadia em Roraima. Daqui em diante o senhor não será mais problema meu...

Mouzon foi deixando a sala, não sem antes ouvir o último aviso do traficante:

– Volto a dizer, delegado. O Senhor está brincando com fuego...

terça-feira, 1 de maio de 2012

O SENHOR DAS ÁGUAS - UNIDADE IX - CAPÍTULO 2 (CONTINUAÇÃO)


– Em qualquer lugar do mundo eu me sinto em casa, delegado.

– Aonde o senhor recebeu seu treinamento, seu pilantra?

– Eu já disse ao senhor, delegado... Onde eu treinei ou deixei de treinar, o senhor não chega nem na porta dos fundos, Cucaracha!

– Foi na CIA? Ou na corrupta e destroçada KGB?

– Faz diferença?

– Realmente não, Amarilla, porque agora eu te peguei. Eu só quero saber qual o seu envolvimento com essa porra toda da Raposa Serra do Sol, e as conexões disso tudo com o tráfico e das mortes dos ex-oficiais do 7º PEF em São Paulo e em Mato Grosso... O que está acontecendo realmente aqui?... Conte pra mim, vai. Talvez eu deixe que você escolha o melhor lugar pra ficar preso... Onde fica melhor pra você, hem?

– Eu já disse, delegado, mas o senhor parece que não me escutou...

– Escutei sim. Eu vou mandar o senhor pra lá, sim, mas embrulhado num saco preto do IML... Você sabe o que é o IML, Amarilla?

– O mesmo lugar que muitos de vocês irão quando eu sair daqui...

– Isso eu duvido muito, Amarilla. Sabe porquê? Porque você estará no inferno antes de nós, e não poderá fazer nada pra mudar o seu destino...

– O senhor realmente não desconfia de nada, delegado?

          – Claro que desconfio... O seu mal é pensar que todos nós somos idiotas... É claro que existe um plano engenhoso que costura tráfico de drogas e de influência por todo o mundo; não é só uma questão do lucro exorbitante que os negócios com as drogas ilegais rendem. Eu desconfio disso há muito tempo; só me pergunto o porquê... O que a reserva Raposa Serra do Sol tem a ver com isto, Amarilla?