quinta-feira, 30 de junho de 2011

"SEM NOÇÃO"

A gíria é um recurso popular espontâneo que modifica a linguagem corrente, dando-lhe novas acepções que, com o tempo, acabam enriquecendo o idioma falado, a tal ponto que certas locuções ou termos acabam entrando para o vocabulário culto usado na literatura em geral.
Ora, nada mais criativo do que além de acrescentar outras acepções à língua, a própria expressão em seu significado usual ser adotada por um vocabulário jovem a fim de expressar uma situação corriqueira, embora pejorativa, dentro deste mesmo universo jovem que, muitas vezes, de uma maneira mais ampla, extrapola um conceito muito em voga atualmente que é o de "tribo".
Temos muitos exemplos de palavras ou locuções que entraram no terreno da gíria para, após um período de maturação e aceitação, caírem em esquecimento.
Entretanto, nestes últimos tempos, existe uma expressão muito falada por todo mundo que traduz melhor do que qualquer outra estes tempos de loucura total em que estamos inseridos...
O termo "sem noção", mais do que traduzir um estado de espírito momentâneo, em que uma pessoa faz ou pensa besteira, ou seja lá que outra idéia ela possa significar num contexto maior, é a expressão do momento.
Numa sociedade egocrática, em que cada membro olha apenas para o seu próprio umbigo, cuja preocupação maior seja o consumo; nesta sociedade onde seus membros estão anestesiados de toda e qualquer reação inteligente, de raciocínio filosófico, intuitivo, convergente, apelando para violência ao menor estímulo, onde a figura de governantes, deputados, vereadores, enfim, a figura pública consiste de prevaricadores corruptos, cínicos, mentirosos, e mal-educados sem distinção de classe social ou de nível cultural, e aí sim temos uma democracia plena; esta sociedade onde reina o caos e a ineficiência faz o seu eterno acampamento, chega ao ápice de sua maturidade devastadora. Neste exato momento, cada um de nós, em maior ou menor grau, pode-se considerar um "sem noção". Uma sociedade inteiramente falida em seus conceitos e determinações, que não pode sobreviver sem que uma catástrofe englobe a todos. Este seria o resultado lógico disto que aí está, mas este não é o modelo que nós, leitores inteligentes, pessoas de bem, queremos para esta cidade, este estado, este país...
Queremos uma cidade, um estado, uma nação, onde a organização social inteligente, livre de mazelas e leis canhestras, estimule cidadãos de mentes sadias, que evitem a todo o custo contornar a norma estabelecida para que possam se beneficiar de alguma forma espúria com aquilo que não podem obter de maneira reta. Queremos cidadãos que zelem pela decência pública e não a tomem para si e para sua família em detrimento de outros menos privilegiados; queremos orgãos públicos que cumpram de fato seu papel constitucional, agindo nas comunidades e trabalhando em prol de uma vida civil plenamente satisfeita, onde o cidadão pague pelo serviço e tenha total retorno dos serviços prestados, e não apenas feudos políticos mesquinhos para beneficiar certos grupos pelo maior tempo possível; queremos, enfim, uma cidade, um estado, um país em que o cidadão de uma maneira geral se sinta seguro e protegido, e não uma vítima deste mesmo estado, cidade ou país, que o deixa absolutamente aparvalhado, sem compreender os mecanismos pelos quais ele, cidadão, possa tornar-se participativo, interragindo com uma autoridade pública útil aos interesses gerais, ao invés de o tornar uma vítima do poder público maquiavélico.
Queremos um país que o cidadão tenha orgulho de possuir a sua cidadania, pelos direitos conquistados e pelos deveres que tem de cumprir para que todos possam sentir o mesmo, receber equanimemente na medida dos seus esforços, e não somente vestir uma camisa de futebol que, depois de encerrada a partida, ele tenha que voltar à triste realidade do cidadão ludibriado, que quer levar vantagem em relação ao seu vizinho num golpe de esperteza aplaudido por meia dúzia de sicários.
Porque este sistema que aí está existe por culpa nossa! Um pouco por conta das engrenagens engendradas por este sistema tacanho em que nós vivemos, que eu pretendo esmiuçar na publicação que deu idéia a este blog, em breve, para comemorar um ano que estas páginas estão na rede, mas, principalmente, por nossa política de enfiar a cabeça por debaixo da terra para não ver nada.
A omissão é uma das maiores razões de desastres na história pólítica da humanidade. Os exemplos abundam. O fato é que este sistema está levando as pessoas a uma loucura mais ou menos planejada, talvez com o intuito de esvaziar o planeta para os mais bem dotados, os "escolhidos", que criam os sistemas pelos quais nós vamos sendo tangenciados como bois no pasto, prestes a servir de comida...
Esta é a imagem mais coerente desta situação, por mais batida que esteja... 
Mas quem são esses "escolhidos"...?
Somente eles se reconhecem. Mas nós queremos salvar a nossa pele, os excluídos, 90 % da população, e queremos dizer não a todo este sistema que nos enlouquece aos bocadinhos, e do qual não nos damos conta.
Queremos modificar o ensino, a forma como ele é administrado e passado aos alunos, bem como seus objetivos no futuro e sua aplicação na sociedade; queremos modificar a economia, a forma como ela é gerida pelos asseclas dessas eminências pardas, e a maneira como os recursos são distribuídos a todas as camadas sociais; queremos transformar toda a cultura de massa, para que o peso do lixo cultural que nos massacra vá perdendo a sua força na mídia e no coração das pessoas, em que pese toda a bagagem cultural de um país plural...
Queremos um povo culto e bem educado, para que cada cidadão respeite com dignidade  o seu próximo, não porque a lei o obriga a fazê-lo, e sim por ele saber que é dando que se recebe...
Queremos saúde gratuita e de qualidade em cada distrito das cidades, porque saúde é um direito de todos e obrigação de um estado responsável. As pessoas, quando equilibradas em seu meio natural, querem a vida, e não a morte. Morte somente a este sistema que se alimenta da infelicidade alheia. 
Queremos transporte público que atenda às necessidades da população como um todo, e não este desrespeito à dignidade humana que se verifica em todas as estradas e vias públicas das cidades, dos estados e do país como um todo. Todos querem ter o seu carro novo como um conforto a mais para um cidadão bem equllibrado, mas não uma máquina assassina nas mãos de multidões de insensatos, sem lei no trânsito, e sem lei nas esquinas.
Uma Justiça que seja o espelho desta sociedade próspera e que trabalha em prol do ser humano, e não esta que se diz cega pela letra da lei, mas que enxerga muito bem quando o negócio é lucrativo...
Queremos um estado de coisas que muitos possam dizer talvez ser uma utopia, mas este é um direito que ainda sai de graça: o direito de sonhar acordado.
A sociedade atual é pior que a bruxa dos contos de fadas infantis... Estimula nossos desejos mais pueris, para então pegar-nos como a insetos incautos em sua rede destrutiva. Somos um bando de "sem noção" mergulhados num eterno pesadelo infantil, a de que somos alguma coisa no conjunto do universo... Ah, se soubéssemos a verdade que jaz lá fora do que de fato somos nós... Ah, se pudéssemos enxergar a realidade plena, sem traves nos olhos, veríamos que no fundo não passamos é disto mesmo... Um grupo de crianças "sem noção".

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