Mouzon chegou logo
depois da ligação.
Felipe estava
sentado num dos bancos de cimento que ficavam no calçadão da praia. Solitário,
contemplativo.
– Não consegui
falar mais com você... – disse Mouzon, calmo, sentando-se bem ao seu lado, e
sem fitá-lo, como se quisesse disfarçar que o conhecia, embora esta não fosse
sua intenção. Passou a olhar para o mar sem fim, igualmente num silêncio
hermético. – Eu queria que você fosse me encontrar na sede da Folha da Tarde...
– O que aconteceu?
– Muita coisa...
– Acabei de
destruir o meu celular...
– Porque você fez
isso?
– Porque eu quero
destruir tudo o que atrapalhe a minha liberdade.
– Garoto, estou
começando a ficar preocupado com você, sabia?
– Não perca o seu
tempo com isso...
– É sério, rapaz.
Dentro de pouco mais de uma semana, sua licença termina...
– Não vou voltar
pro Exército, Mouzon...
– O quê?!...
– Nem adianta
tentar me dar lição de moral...
– Eu até posso
compreender os seus motivos, mas você não vai consertar o mundo...
– E quem te disse
qu’eu quero consertar o mundo?... – Mouzon balançou a cabeça, lamentando o
estado do seu amigo, porém Felipe justificou-se antes que o delegado pudesse
corrigi-lo. – Trata-se de uma questão de limpeza somente...
– Felipe! Você não
é mais nenhum adolescente! – advertiu o delegado em tom de reproche. – Desculpe-me
ser tão franco com você, mas você está agindo como um menino mimado, que acaba
de perder seu brinquedo pra outro garoto mais forte, e não vê alternativa senão
chorar! Todo mundo tem perdas na vida, e é nesta hora que temos de aproveitar a
lição e crescer... A revolta, num primeiro momento, é benéfica, mas porque ela
nos dá gana de reagir, não nos serve de nada se ficarmos agindo como um rebelde
sem causa, que passa a punir o mundo por uma derrota natural, que acontece a
todo mundo...
– Mouzon, eu não
sabia que você era filósofo.
– Deixe de criancice,
Felipe! Sabe o que vai te acontecer se não voltar dentro de uma semana pra sua
unidade?...
– Serei acusado de
deserção.
– Pior, Felipe! Você
vai ser processado e vai perder tudo o que lhe resta...
– O que me resta?
– Sua dignidade.
– Esta já perdeu o
valor há muito tempo, Mouzon.
– Pode ser. Mas nós
estamos aqui pra não deixar a peteca cair...
– Você talvez ainda
tenha esta ilusão, eu não tenho mais!
– Tá certo, Felipe.
Queres te suicidar, vai em frente. Eu não vou mais bancar o pai pra você...
– Obrigado. Isso é
comovente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário