domingo, 27 de março de 2011

O ARQUITETO COMO METÁFORA DE DEUS

   Fica claro no diálogo entre Neo e o Oráculo, aliás, personagem estrategicamente formatado no sexo feminino, a questão da "escolha"...
  Voltamos a falar da trilogia Matrix, e o parágrafo acima refere-se à postagem do Fantasma na Máquina, lembram-se?...
   Pois é... No diálogo fundamental de toda a trilogia Matrix, o que acontece entre Neo e o Arquiteto, isto igualmente fica patente: a escolha. Somos escravos dela.
   Mas este diálogo traz a tona outras questões fundamentais. Aqui transparece o cerne da questão que move os filósofos desde a época trágica dos atenienses...
   A do "porquê" das coisas...
   A explicãção de tudo, e o desdobramento de todo o resto...
   Notem que o Arquiteto, como uma metáfora de Deus, é frio, calculista, "matemático". Ele carrega a razão acima da emoção, exatamente como o Deus Mosaico das primeiras linhas bíblicas. No entanto, não podemos perder de vista o momento histórico daquela oportunidade: tínhamos um líder, Moisés, a frente de um povo saído da escravidão no Egito, sem eira nem beira, diante do Sinai desafiador, com uma pretensa terra prometida que lhes aguardava(aqui, talvez, nós tenhamos outra metáfora bíblica), e com um agravante: muitos daqueles hebreus dos primeiros tempos assimilaram as doutrinas dominantes do vale do Nilo, não estavam preparados para a mensagem revolucionária do Deus único. Ou seja, não seriam palavras melífluas, como as de Jesus de Nazaré, segundo os evangelhos canônicos, que iriam convencer aquele povo sáfaro das "verdades" que Moisés trazia.
   Aliás, este é o maior desafio do "messias eletrônico" em Matrix, o ponto divergente entre ele e o seu criador, o Arquiteto: EMOÇÃO X RAZÃO. O que deve prevalecer? Mais uma vez a grande questão travada é a da ESCOLHA, porque o Arquiteto indica a Neo as duas únicas opções que ele dispõe: por uma porta está a salvação de Zion, a cidade Rebelde, porém a morte de Trinity, sua amada, ao passo que na outra reside a salvação de Trinity, mas a eliminação de Zion, e, por conseguinte, a erradicação da vida humana, uma vez que é o próprio Arquiteto quem diz no início do diálogo que esta Matrix fracassou como as outras seis anteriores...
   E a esperança...? Será ela o segredo do nosso pretenso e duvidoso sucesso, porém, paradoxalmente, a semente da tragédia...?
   Mais uma vez é o Arquiteto quem proclama, no início do encontro, que a primeira Matriz era perfeita, mas que seu retumbante sucesso é tão pungente quanto sua fragorosa derrocada... O que quer isto dizer...? Que a perfeição não existe, como nos diz o Livro Tao te Qing...? Ou que a soberba dos deuses primordiais transcedeu sua humanidade, gerando os monstruosos Titãs exilados por Zeus...? É a queda dos anjos vista por outro viés, já que estamos falando de temas bíblicos, mas se trata do mesmo assunto...
   Será que estamos irremediavelmente atados ao destino de um eterno reconstruir...? Será que todos os nossos esforços em evoluir sempre terão suas vítimas, seus mártires, seus "bodes expiatórios"?
   Ainda assim, fica claro pela fala do Arquiteto, e também pelas repetições da História humana, esta, sim, real, autêntica, que ainda não aprendemos o fundamental nesta matéria do existir: a lei do amor. Isto inclui compartilhar, dividir, solidarizar-se, enxergar o outro sem preconceitos ou idiossincrasias, ver apenas o fundamental e inquestionável: a essência do ser é a mesma, independentemente de inteligência ou quantidade de patas, mas isto, que parece tão simples a princípio, é o mais difícil de praticar...
   Não se trata de uma mera escolha maniqueísta entre a razão de existir e o existir com amor, mas se nós olharmos o mundo, o universo, com os olhos da razão, talvez cheguemos à conclusão de que o único caminho seja mesmo aquele que tão poucos tentaram mostrar a bilhões ao longo da história, o mesmo que Neo escolheu...
   Mas o seu ato de amor não se restringe apenas pela escolha de um homem pela sua mulher, ele também dá a vida pelo povo de Zion, e se despe de preconceitos para aliar-se às máquinas sanguinárias, aliás, aqui reside outra das poderosas metáforas da trilogia, porque as máquinas representam nosso lado sumamente insensível, ou não estamos como que robotizados hoje, em relação ao outro? O mais importante, naquele momento da trama, é desarmar o nosso lado negro, egocêntrico, que não deseja compartilhar nada, nem compreender o diferente, só almeja o poder em si mesmo, alijado do espírito de solidariedade que deve nortear a evolução da humanidade; isto é representado pelo agente Smith, o mal a ser banido de uma Terra "mecanizada"...
   Em suma, Matrix é o filme das metáforas...
   É ledo engano achar que tudo não passa de um filminho de fição e aventura...
   Quem não viu Matrix, veja...
   Quem viu e não se lembra, volte lá e pense, baseando-se nestas leituras... Ou invente outra, que mal há nisto?
   O Senhor das Àguas só deseja a luz para iluminar nosso universo penumbroso...
   Doa a quem doer.
PS: Porque o personagem do Oráculo é especialmente criado com o sexo feminino? É o Arquiteto quem diz: se ele "é o pai da Matrix, o Oráculo é, seguramente, a mãe". Trata-se dos dois aspectos da divindade, masculino e feminino. E é o lado feminino, o mais sensível, sempre!, o que enxerga melhor!

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