Enquanto isso, os
outros só esperavam uma oportunidade como esta para golpear sem restrições...
Várias tribos estavam
em pé de guerra, afinal suas terras estavam sendo invadidas por dois grandes
grupos de ávidos capitalistas.
Os grileiros vinham
sendo monitorados pelos militares e a Polícia Federal há algum tempo, porém, do
outro lado da reserva, uma turma de madeireiros ilegais também preparava uma
incursão...
Ninguém sabia da
existência daqueles madeireiros...
Quer dizer, ninguém
sabia da invasão em tempo real...
Porquanto este
grupo de invasores também vinha sendo monitorado constantemente pelas
autoridades, embora nada de concreto fosse feito para suster a invasão dupla.
Mas nós sabíamos de
tudo o que estava acontecendo na Raposa Serra do Sol...
E não era de hoje!
Estávamos munidos
de laptops ajustados a um satélite europeu, que, por sua vez, estava acoplado a
um GPS de alta precisão. Podíamos acompanhar a movimentação de todos os grupos
envolvidos, de uma forma ou de outra, na disputa pela Raposa...
Fizemos uma série
de ligações com toda a imprensa instalada na capital de Roraima, inclusive
outras ONGs que, como a Sweetwaters, tinha interesse que a situação fosse
resolvida a favor dos povos indígenas, embora alguns daqueles chefes tribais,
nós também tínhamos conhecimento disso, tivessem empenhado sua palavra com
grandes empresas multinacionais ligadas a diversos setores da indústria pesada...
O drama da Amazônia
se configurava como um imenso caos, que só iria beneficiar os grandes
capitalistas mundiais...
Isto muita gente
também tinha conhecimento...
Mas nada se fazia de
concreto.
No meio deste
aparato todo, eu me sentia meio que uma formiga a ser esmagada a qualquer
momento por pés monumentais...
E isto poderia vir
de qualquer lado, por qualquer um que estivesse procurando um bode expiatório para
desafogar o seu fracasso...
Claro que esta
impotência não se comparava a dos povos indígenas, que certamente não poderiam
fazer nada para manter as terras que lhes pertenciam a gerações, nem a
população do planeta como um todo, que via o seu “pulmão” sendo destruído
lentamente, ainda que esta noção da floresta como o “pulmão do mundo” fosse
extremamente controvertida entre os ecologistas...
A complexidade das
relações entrelaçadas de interesses escusos se confundia ainda mais quando entravam
em jogo os interesses das organizações que pretendiam salvar a Amazônia...
Tornara-se
praticamente impossível discernir o certo do errado, e o lado bom do ruim...
Enquanto isso, a
contagem regressiva para o fim da Amazônia já começara...
E, sinceramente, eu
nem vi como tudo começou...
Contanto fosse
previsível este desfecho...
Ânimos exaltados de
parte a parte, pois cada lado só queria enxergar aquilo que lhe interessava...
E o direito da
massa?!
Essa... Venhamos e
convenhamos... Não tem direito algum!
Os madeireiros estavam
cheios de jagunços superarmados a seu serviço...
Os índios,
coitados, combatiam seus inimigos, o mundo inteiro, com arcos, flechas e
bordunas...
A FUNAI, o IBAMA, a Polícia Federal demoraram
muito em conversas parabólicas. Chegaram depois pra contar o número dos corpos...
Curiosamente, até
estrangeiros estavam entre as vítimas da “guerra”. Pessoas comuns,
profissionais liberais, professores, até operários partidários de Chico Mendes,
quedaram entre inumeráveis companheiros nossos...
Tudo gado na conta
dos Senhores de Engenho...
Lá onde estavam
posicionados os grileiros, a coisa não foi diferente...
Manchetes em todos
os principais jornais do planeta: “CARNIFICINA DA AMAZÔNIA!”, estampava um; “GUERRA
EM PLENA FLORESTA AMAZÔNICA”, dizia outro...
E assim vai...
Entre os militares
também... Muitos mortos e estropiados...
Alguém, não sei bem
quem, chegou a comparar esta catástrofe aos Sertões de Euclides da Cunha...
Isso foi o que
testemunhei naquele triste dia na Raposa Serra do Sol.
Estou voltando pro
Rio agora, mas, infelizmente, a notícia da tragédia chegou antes de mim...
Não tenho muita
novidade pra contar a Wirna...